A gravação de assembleias condominiais é um tema que levanta questões legais e práticas importantes. No Brasil, não há proibição explícita na legislação contra a gravação dessas reuniões, mas a prática deve ser conduzida com atenção a aspectos legais e éticos para garantir que seja realizada de maneira adequada.
A gravação de assembleias pode ser considerada uma invasão de privacidade caso não haja consentimento dos participantes. Portanto, é essencial informar todos os presentes sobre a intenção de gravar e obter seu consentimento explícito. Além disso, é importante registrar na ata da reunião que a gravação foi anunciada e que os participantes consentiram, assegurando assim a transparência do processo.
A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) estabelece diretrizes sobre o tratamento de dados pessoais, o que inclui gravações que contém imagens e vozes dos participantes. Assim, é crucial garantir que a gravação esteja em conformidade com a LGPD, respeitando princípios de transparência, finalidade e segurança. O Código Civil Brasileiro, embora não aborde especificamente a gravação de assembleias, enfatiza a boa-fé e o respeito aos direitos dos condôminos.
Verificar a convenção do condomínio e o regimento interno é fundamental para identificar quaisquer regras específicas sobre gravação. Se tais documentos não abordarem o tema, pode ser interessante propor alterações que incluam disposições claras sobre a gravação de assembleias, aumentando a transparência e a segurança jurídica.
A gravação pode servir como uma ferramenta útil para garantir transparência e precisão no registro das deliberações realizadas durante a assembleia, complementando a ata escrita e ajudando a esclarecer eventuais dúvidas ou controvérsias. No entanto, é essencial definir claramente a finalidade da gravação e limitar seu uso a este propósito específico, assegurando que ela não seja divulgada publicamente sem autorização.
Os dados gravados devem ser armazenados de forma segura para proteger contra acessos não autorizados, perdas ou vazamentos, adotando medidas de segurança como criptografia e controle de acesso. É igualmente importante definir um prazo de retenção para essas gravações, após o qual elas devem ser deletadas de maneira segura, conforme as necessidades do condomínio e as diretrizes da LGPD.
Vejamos o entendimento dos Tribunais.
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. COMINATÓRIA. AGRAVO RETIDO. CERCEAMENTO DE DEFESA. OITIVA DESNECESSÁRIA DE TESTEMUNHAS. IMPROVIMENTO. MÉRITO. GRAVAÇÃO EM ÁUDIO DE ASSEMBLEIA CONDOMINIAL. VIOLAÇÃO DA IMAGEM OU VIDA PRIVADA DOS CONDÔMINOS. INOCORRÊNCIA. DIREITO DE FISCALIZAÇÃO DO CONDÔMINO. 1. Não ocorre cerceamento de defesa quando o juiz processante – destinatário do conjunto probatório – justificadamente considera suficientes as provas produzidas nos autos e julga desnecessárias outras diligências para a resolução da lide. 2. A gravação em áudio de assembleia condominial não viola as garantias constitucionais inseridas no art. 5º, inciso X, da CF, já que as deliberações dizem respeito à coletividade de moradores, não servindo ao debate acerca da intimidade, privacidade ou vida privada dos condôminos. 3. A gravação em áudio do conteúdo deliberado em assembleias de condomínio não viola a intimidade ou privacidade dos condôminos, quando o propósito é o registro pormenorizado do que restou decidido, a fim de resguardar todos os moradores de um eventual equívoco ou incorreção na lavratura e registro das atas. 4. Agravo retido improvido. Apelação improvida. Sentença mantida.
(TJ-DF 20110110480745 DF 0014352-08.2011 .8.07.0001, Relator.: ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS, Data de
Julgamento: 20/02/2013, 4ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE: 28/02/2013. Pág.: 122)”
A decisão traz à tona uma questão relevante sobre o equilíbrio entre a proteção da privacidade prevista na Constituição Federal (art. 5º, X) e o direito à informação e à transparência em assembleias condominiais. A interpretação do Colegiado de que as assembleias têm caráter de ato público é coerente, uma vez que as decisões tomadas em tais eventos afetam diretamente a coletividade envolvida, sendo razoável que as deliberações sejam registradas. O argumento de que a gravação não viola a intimidade porque não há exposição indevida dos moradores em um espaço público delimita os limites dessa proteção constitucional.
Ademais, a decisão é importante para evitar um uso indevido do direito à privacidade como ferramenta de ausência de transparência administrativa, particularmente quando existem suspeitas de irregularidades na gestão do condomínio. Contudo, a autorização da gravação deve estar acompanhada de parâmetros claros para evitar potenciais abusos, como a utilização das imagens ou áudios para finalidades diversas ou vexatórias.
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No caso abaixo o Desembargador recomendou a gravação da assembleia com participação de um moderador.
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. Assembleia condominial. Liminar concedida para autorizar a assembleia pela modalidade virtual, recomendada a gravação com participação de moderador. Não se vislumbra prejuízos aos condôminos a realização da nova assembleia de forma eletrônica. Inteligência do artigo 1.354-A incisos I e II, do Código Civil. Imprescindibilidade de preservação dos direitos de voz, debate e de voto aos condôminos, não havendo elementos para presumir que os inconvenientes da reunião anterior se repitam. RECURSO PROVIDO.
(TJ-SP – Agravo de Instrumento: 2099010-46.2024.8.26 .0000 São Paulo, Relator.: Dario Gayoso, Data de Julgamento: 30/04/2024, 27ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 30/04/2024)”
Portanto, caso seja considerado adequado, é recomendável, mediante aviso prévio aos presentes, realizar a gravação da assembleia. Esse procedimento, além de facilitar a elaboração da ata, também contribui para coibir comportamentos mais exaltados de alguns moradores, ajudando a manter a ordem durante a reunião de condôminos.
Em resumo, embora a legislação brasileira não proíba a gravação de assembleias condominiais, é essencial proceder com cautela, respeitando a privacidade dos participantes e as disposições legais aplicáveis, especialmente a LGPD. Informar os participantes, obter seu consentimento, verificar as regras internas do condomínio e garantir a segurança e o uso apropriado da gravação são passos fundamentais para uma prática adequada e transparente.
*Advogado militante na área de Direito Civil; Especialista em Direito Condominial; Pós-graduado em Direito e Negócios Imobiliários pela Damásio Educacional; Pós-Graduado em Direito Tributário pela PUC/SP; Pós-Graduado em Processo Civil pela PUC/SP; Membro da Comissão de Condomínios do Ibradim, Palestrante especializado no tema Direito Condominial; Colunista dos sites especializados Sindiconet, Sindiconews, Expresso Condomínio, Condomínio em Foco, e das revistas “Em Condomínios” e” Viva o Condomínio”