Assembleia ordinária de condomínio: pauta mínima implícita por lei

pauta mínima assembleia de condomínio

Por André Luiz Junqueira

Sumário:

  1. Base normativa e tipicidade legal da AGO
  2. A pauta mínima como elemento implícito da convocação
  3. Fundamentos de segurança jurídica e boa-fé
  4. Limites e boas práticas
  5. Conclusões

Resumo — Defende-se que a assembleia geral ordinária (AGO) é anual e possui conteúdo mínimo legalmente tipificado: (i) prestação de contas, (ii) aprovação do orçamento/previsão orçamentária e contribuições, e (iii) eleição de cargos, quando couber. Por se tratar de núcleo obrigatório definido em lei, tais itens estão implícitos na própria convocação da AGO feita no prazo convencionado, ainda que não descritos um a um na ordem do dia.

Palavras-chave: condomínio edilício; assembleia geral ordinária; prestação de contas; orçamento; eleição; convocação; pauta.

  1. Base normativa e tipicidade legal da AGO

O Código Civil determina que o condomínio se reúna anualmente para: aprovar o orçamento (previsão orçamentária) e as contribuições dos condôminos, apreciar/prestacionar contas e, se for o caso, eleger síndico e conselho fiscal (quando existente).
Acresce que: (a) a prestação de contas é dever legal do síndico,2 e (b) o prazo do mandato do síndico é de até dois anos, admitida renovação, razão pela qual a eleição pode ser anual ou bienal, conforme a convenção.3
A Lei 4.591/1964 (art. 24 e correlatos), em regime de convivência com o Código Civil, igualmente atribui à assembleia competências para aprovar orçamento/contas e eleger a administração, reforçando a natureza típica desses temas na AGO.
Conclusão parcial: a AGO não é um rótulo vazio; ela é um tipo legal com conteúdo mínimo necessário. Esse “conteúdo essencial” independe de vontade do convocante.

  1. A pauta mínima como elemento implícito da convocação

O sistema jurídico brasileiro adota, para as assembleias condominiais, o princípio da convocação específica (ordem do dia), cujo objetivo é evitar surpresas e proteger a boa-fé e o direito de informação dos condôminos. Todavia, quando a própria lei predetermina um núcleo necessário de matérias para a reunião ordinária anual, não há surpresa possível quanto a esses pontos: todos sabem — ou devem saber — que contas, orçamento e eventual eleição integram a AGO.
Daí decorrem três consequências:
Presunção legal de conteúdo: convocada a “Assembleia Geral Ordinária” no tempo correto fixado pela convenção, presume-se incluído o núcleo legal mínimo (contas, orçamento e eleições no ano respectivo), ainda que não grafado na ordem do dia.
Vinculação do tipo: a expressão “AGO”, utilizada na convocação, remete diretamente ao arcabouço do art. 1.350 do CC e correlatos. A pauta mínima não deriva de liberalidade do síndico, mas da tipicidade legal do ato.
Coerência sistemática: negar a implicitude equivaleria a admitir a existência de “AGO sem contas” ou “AGO sem orçamento”, figura incompatível com o desenho normativo.

  1. Fundamentos de segurança jurídica e boa-fé

A leitura pela implicitude harmoniza-se com:
Boa-fé objetiva e dever de informação: a previsibilidade anual desses temas integra o horizonte legítimo de expectativas do condômino; ninguém pode alegar surpresa quanto ao que a lei impõe como conteúdo necessário da AGO.
Venire contra factum proprium / supressio-surrectio: práticas reiteradas do condomínio em tratar tais itens na AGO (com ou sem menção explícita) consolidam expectativas e coíbem condutas oportunistas de anulação por formalismo excessivo quando não houve efetivo prejuízo informativo.
Razoabilidade e instrumentalidade das formas: o direito protege o resultado útil (controle das contas, aprovação do orçamento, renovação de mandatos) e repudia nulidades sem dano concreto, sobretudo quando a própria lei impõe o tratamento das matérias.

  1. Limites e boas práticas

Sem prejuízo da tese aqui defendida não. Recomenda-se, por prudência administrativa e evitar discussões:
Manter a listagem expressa dos itens do núcleo mínimo (boa prática que reduz litigiosidade).
Disponibilizar previamente demonstrativos, balancetes e proposta orçamentária em tempo hábil para exame (o dever de prestar contas é material, não meramente ritual).
Distinguir matérias extraordinárias (obras, alterações convencionais, penalidades etc.), que exigem indicação específica na ordem do dia — a implicitude não se estende a elas.
Observar a convenção: se o texto convencional exigir menção pormenorizada, deve-se cumpri-la. A implicitude opera como fundamento de validade, mas em nade prejudica se for expresso, obviamente.

  1. Conclusões

A AGO é anual e tem conteúdo mínimo legalmente tipificado: prestação de contas, aprovação do orçamento/contribuições e, quando for o ano, eleição de síndico e órgãos previstos.
Esse núcleo é implícito na própria convocação da AGO realizada no prazo convencionado, dispensando, em tese, a menção expressa de cada item para fins de validade das deliberações correspondentes.
A implicitude decorre da tipicidade legal (art. 1.350 CC e correlatos), da boa-fé objetiva e da instrumentalidade das formas, sem prejuízo de que a melhor prática continue a enunciar tais itens para maximizar transparência e reduzir disputas.
A tese não alcança matérias extraordinárias e não autoriza contrariar a convenção quando esta exigir detalhamento expresso.

*André Luiz Junqueira é professor, advogado com 20 anos de experiência e autor do livro “Condomínios – Direitos & Deveres”; Sócio titular da Coelho, Junqueira & Roque Advogados, atuante em todo Brasil e que representa cerca de 10% dos condomínios do Rio de Janeiro; Pós-graduado em Direito Civil e Empresarial pela Universidade Veiga de Almeida. MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getulio Vargas; Certificado em Negotiation and Leadership pela Universidade de Harvard; Professor convidado do SECOVIRio, ABADI, Gábor, GP Academy URBX e da Escola Superior de Advocacia (ESA) da OAB/RJ; Consultor jurídico da ABADI; Membro das Comissões de Direito Urbanístico e Imobiliário, Condominial, de Sindicatura Profissional, de Gestão de Propriedades Urbanas e de Turismo da OAB/RJ; Membro e ex-diretor jurídico da ABAMI; Membro da Comissão de Condomínios do IBRADIM; Membro da Comissão de Direito Imobiliário do IAB; Colunista dos portais SíndicoNet, Universo Condomínio e da Revista Síndico – Cidades & Serviços; Consultor da Revista Condomínio etc.

Facebook
Twitter
LinkedIn

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Posts relacionados

Newsletter

Fique por dentro de tudo que é importante sobre o mercado condominial!