Moradia social: prédios ignoram lei e liberam aluguel de curta duração

locação de curta temporada

Proprietários de imóveis do tipo HIS e HMP continuam com aluguel de curta duração apesar de proibição do modelo pela Prefeitura de SP


Quatro meses depois do prefeito Ricardo Nunes (MDB) assinar um decreto proibindo os aluguéis de curta duração em imóveis destinados à Habitação de Interesse Social (HIS) e de Mercado Popular (HMP), investidores que compraram esses apartamentos continuam anunciando as moradias em plataformas como Airbnb e Booking.

A prática tem acontecido com a liberação dos condomínios, em diferentes bairros da cidade, e à revelia da Prefeitura de São Paulo, que não conseguiu avançar o suficiente na fiscalização dos empreendimentos.

A gestão diz que recebeu apenas duas denúncias sobre o problema desde a publicação do decreto, e alega que vai identificar e notificar os proprietários destes endereços, localizados na Rua Paulo de Avelar, 516, na Vila Dom Pedro II, zona norte de São Paulo, e na Rua Asdrubal do Nascimento, 174, na Bela Vista, no centro da capital paulista.

Anúncios de apartamentos nessa modalidade, no entanto, são encontrados aos montes nas plataformas online voltadas aos aluguéis por temporada — e por preços altos.

Em um dos anúncios vistos pelo Metrópoles, por exemplo, um proprietário cobra cerca de R$ 800 por duas diárias em um apartamento HMP ao lado do Allianz Parque, em Perdizes, na zona oeste, nas datas em que acontecerão shows do cantor Gilberto Gil no estádio.

A proibição para os aluguéis de curta duração foi anunciada em maio deste ano pela Prefeitura de São Paulo como forma de evitar as fraudes no uso desses apartamentos.

Relembre a história

Os imóveis HIS e HMP são voltados a famílias com renda familiar mais baixa – de até seis salários mínimos no caso dos HIS, e de seis a 10 salários mínimos nas moradias estilo HMP.

A construção de empreendimentos destinados a essas faixas de renda, e em áreas próximas a estações de metrô e corredores de ônibus, foi incentivada pelo Plano Diretor de 2014.

O objetivo era aproximar a população com menor poder aquisitivo de bairros com mais infraestrutura e emprego.

Por isso, a prefeitura passou a oferecer benefícios às construtoras que lançassem empreendimentos com HIS e HMP nessas regiões.

A medida provocou um aumento na oferta de imóveis com estas características, mas, na prática, parte considerável das moradias não foram destinadas ao público-alvo previsto em lei.

Em áreas cobiçadas da cidade, construtoras fizeram studios se utilizando da regra e venderam para investidores que passaram a alugá-los por preços exorbitantes ou destiná-los para a locação no Airbnb, como uma forma de para potencializar os lucros. Com os valores altos, as pessoas para quem a política pública foi desenhada não conseguiram morar nos endereços.

As denúncias de fraudes na política pública fizeram com que o Ministério Público abrisse um inquérito para investigar o tema, levaram à divulgação do decreto pela prefeitura endurecendo as regras para os imóveis, e culminaram também na criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o tema na Câmara Municipal de São Paulo.

Há alguns dias, a aposentada Maristela Ana Lusa, de 60 anos, foi à CPI denunciar a continuidade dos aluguéis de curta duração no prédio onde mora, o Today Perdizes — o mesmo em que a reportagem do Metrópoles encontrou o anúncio do apartamento por duas diárias a cerca de R$800.

Em entrevista ao Metrópoles, Maristela disse que o tema tem gerado tensão no condomínio e que afirmou que proprietários investidores chegaram a fazer ameaças quando os demais moradores passaram a debater o veto ao Airbnb no local.

“Eu afirmava para eles que, além da nossa convenção proibir, a lei proíbe [nos apartamentos HIS e HMP]. E aí o que eles alegaram é que se a gente continuasse com a intransigência, o prédio ia ficar abandonado, vazio, e eles iam contratar sem-teto para invadir.”

O Metrópoles contabilizou mais de 10 unidades do tipo HMP do Today Perdizes, construído pela construtora Canopus, anunciadas no Airbnb. Também há imóveis anunciados no Booking. Parte dos apartamentos é administrada por agências contratadas pelos proprietários para cuidar da limpeza e gestão das unidades, dispensando os donos de qualquer relação com os imóveis no dia-a-dia.

No número 429 da Rua Álvaro de Carvalho, na Consolação, centro de São Paulo, outro empreendimento, o Today Augusta, também tem unidades HMP anunciadas em plataformas de aluguel de temporada, com autorização do condomínio.

Como parte dos hóspedes que alugam os imóveis são estrangeiros, o condomínio instalou placas em inglês para orientar o público que chega ao local.

Uma parte dos moradores do condomínio, no entanto, entrou na Justiça contra a liberação das locações de curta temporada no local. O grupo alega que o modelo contraria a política pública da prefeitura, desvirtua o uso residencial do condomínio e diz que a autorização da prática foi decidida em uma assembleia irregular.

Os moradores conseguiram uma liminar proibindo a prática em primeira instância, mas outros proprietários conseguiram reverter a decisão em segunda instância.

A bancária Lucidalva Goulart Silva, de 53 anos, diz que os investidores ignoram por completo o decreto da prefeitura, com a justificativa de que eles têm direito à propriedade.

“Eles continuam fazendo [o aluguel de curta duração] normalmente. Só pararam — teoricamente, porque a gente não sabe se fizeram escondido — quando saiu a liminar.”

Fonte: https://www.metropoles.com/sao-paulo/moradia-social-predios-ignoram-lei-e-liberam-aluguel-de-curta-duracao

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