O Impacto da Locação por Curta Temporada em Condomínios com Unidades de Habitação de Interesse Social (HIS) e Habitação de Mercado Popular (HMP)

condomínios e a cidade de SP

A locação por curta temporada, promovida por plataformas como Airbnb, Booking e semelhantes, tem se tornado uma prática difundida em diferentes segmentos do mercado imobiliário. No entanto, quando aplicada em condomínios que abrigam unidades destinadas à Habitação de Interesse Social (HIS) e Habitação de Mercado Popular (HMP), essa prática pode gerar impactos significativos, tanto do ponto de vista jurídico quanto social. Esses empreendimentos têm como objetivo primário atender populações de baixa renda, suprindo uma necessidade essencial: oferecer uma moradia digna às parcelas vulneráveis da sociedade. Contudo, a comercialização temporária dessas unidades ameaça desvirtuar essa finalidade.

Finalidade Social e Regras Legais: Os Fundamentos da HIS

As unidades habitacionais classificadas como HIS e HMP são regidas por normas que visam preservar seu caráter social, assegurando sua ocupação exclusivamente por famílias que atendam aos critérios de renda estabelecidos pela legislação.
Esses imóveis, regularmente vinculados a programas habitacionais como o extinto Minha Casa, Minha Vida, são direcionados a uma parcela específica da população, geralmente com rendimentos entre 1 e 6 salários-mínimos.

Entretanto, a prática de locação por curta temporada nesses empreendimentos desvirtua os objetivos dessas políticas públicas, resultando em:

• Desvios da função social da propriedade, ao transformar imóveis de cunho habitacional em ativos de mercado lucrativos;
• Prejuízos à coletividade condominial, comprometendo a convivência e a segurança dos moradores permanentes;
• Riscos legais e administrativos, como multas, reversão de benefícios fiscais e outras sanções previstas em regulamentos
públicos para práticas contrárias à legislação.

Para reforçar a finalidade social, o Decreto nº 64.244/25 proibiu a locação de curta temporada em imóveis HIS e HMP, prevendo penalizações rigorosas aos proprietários que descumprirem a norma.

Cenário Jurídico e Administrativo: Regras e Limitações

Embora a Lei nº 16.402/2016, que regula o parcelamento, uso e ocupação do solo no município de São Paulo, não traga uma vedação explícita à locação por temporada em unidades HIS e HMP, seus princípios são claros quanto ao uso predeterminado dessas propriedades. De acordo com a norma, a função social da propriedade deve ser prioridade, algo incompatível com a exploração comercial e as práticas de rotatividade impostas por essas locações.

O Decreto nº 64.244/25 estabelece explicitamente que a locação de curta temporada é proibida em unidades HIS e HMP, independentemente de eventuais decisões tomadas em assembleias condominiais. Assim, mesmo que os condôminos deliberem a favor da prática, a norma pública tem prevalência, subordinando deliberações internas à regulamentação municipal. Tal entendimento sublinha a importância da adequação concomitante às leis municipais e às regras internas dos condomínios.

Impactos nos Condomínios: Convivência e Conflitos

A prática de locação por curta temporada pode desencadear uma série de impactos negativos nos condomínios que abrigam unidades HIS e HMP, tais como:

  1. Precarização do ambiente comunitário: O constante entra e sai de locatários rotativos compromete o senso de segurança e a qualidade de vida dos moradores fixos.
  2. Aumento das despesas condominiais: O uso intensivo das áreas comuns e a maior demanda por serviços, como água, energia e manutenção, geram custos adicionais que recaem sobre todos os moradores, incluindo famílias de baixa renda.
  3. Conflitos internos: A presença de locatários que não compartilham da rotina do ambiente comunitário pode gerar desconfortos e tensões entre os residentes, especialmente em empreendimentos onde a vulnerabilidade social é um aspecto sensível.
  4. Sanções coletivas: Em casos de tolerância por parte do condomínio, este também pode ser penalizado. Isso inclui multas e a reversão de benefícios fiscais concedidos durante a aprovação do projeto. Recentemente, a Prefeitura de São Paulo intensificou as fiscalizações, aplicando penalidades severas quando a prática é confirmada.

    O Papel do Síndico e da Convenção Condominial

    O síndico possui uma função estratégica nos condomínios HIS e HMP, sendo responsável por assegurar o cumprimento das normas e promover a convivência pacífica entre os moradores. O Decreto nº 64.244/25 concede respaldo jurídico para que o síndico aplique sanções a práticas irregulares, como a locação de curta temporada, seja por iniciativa de proprietários, seja pela atuação de terceiros em contrariedade à finalidade social.

    Ademais, é essencial que as convenções condominiais incluam cláusulas explícitas proibindo a locação de curta duração, reforçando a conformidade com as legislações em vigor. Tal medida oferece maior segurança jurídica ao condomínio e reduz os riscos de conflitos ou infrações.

    Quando o síndico identificar irregularidades ou receber denúncias, deverá notificar o responsável pela unidade e exigir a cessação imediata da prática. Caso contrário, o caso deve ser encaminhado às autoridades competentes, como a
    Prefeitura, para as devidas providências.

    Conclusão: A Necessidade de Proteger a Função Social

    A locação por curta temporada em condomínios com unidades de Habitação de Interesse Social e Habitação de Mercado Popular compromete os objetivos fundamentais das políticas habitacionais, ameaçando o equilíbrio das comunidades e os direitos das famílias vulneráveis.

    O respeito à legislação, aliado a uma fiscalização eficaz por parte do poder público e à boa gestão condominial, é indispensável para assegurar que esses empreendimentos continuem cumprindo sua função social. Priorizar práticas que respeitem a finalidade habitacional é essencial não apenas para evitar a especulação imobiliária, mas também para garantir o direito à moradia digna.

    Denúncias de casos de locação irregular podem ser encaminhadas ao telefone 156 da Prefeitura de São Paulo. Infrações podem acarretar multas aos proprietários e, em casos de tolerância, podem trazer sanções ao próprio condomínio, como reversão de benefícios fiscais e ações judiciais.

Fernando Zito é advogado militante na área de Direito Civil; Especialista em Direito Condominial; Pós-graduado em Direito e Negócios Imobiliários pela Damásio Educacional; Pós-Graduado em Direito Tributário pela PUC/SP; Pós-Graduado em Processo Civil pela PUC/SP; Membro da Comissão de Condomínios do Ibradim, Palestrante especializado no tema Direito Condominial; Colunista dos sites especializados Sindiconet, Sindiconews, Expresso Condomínio, Condomínio em Foco, e das revistas “Em Condomínios” e” Viva o Condomínio”;

Facebook
Twitter
LinkedIn

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Posts relacionados

Newsletter

Fique por dentro de tudo que é importante sobre o mercado condominial!