Recebi recentemente em meu escritório um caso que exemplifica os desafios da convivência em condomínios e a importância do equilíbrio entre os interesses individuais e coletivos. Tratava-se de um conflito envolvendo o proprietário de uma unidade classificada como Habitação de Mercado Popular (HMP) ou Habitação de Interesse Social (HIS), que não concordava com a posição do condomínio em relação à proibição de locações de curta temporada.
O Contexto do Caso
A unidade em questão está localizada em um condomínio que, por obrigatoriedade legal, deve obedecer às regras do Decreto Municipal nº 64.244/2025, que impõe restrições específicas às unidades classificadas como HMP/HIS. Segundo o referido decreto, as unidades destinadas à Habitação de Mercado Popular ou Habitação de Interesse Social devem ser utilizadas exclusivamente como moradias, sendo expressamente proibida a locação por curta temporada, como nas modalidades amplamente divulgadas através de plataformas digitais.
O objetivo do decreto é claro: preservar a função social da moradia e assegurar que edificações voltadas para programas habitacionais populares cumpram a finalidade para a qual foram criadas, garantindo acesso a habitação digna às faixas sociais mais vulneráveis.
No caso específico, o proprietário havia sido advertido e multado pelo condomínio por manter o formato de locação proibido. Apesar das penalidades e das explicações fornecidas, sua postura permaneceu resoluta, insistindo na interpretação particular de que a medida seria indevida e desrespeitaria direitos individuais.
O Desafio Jurídico
De um lado, temos o direito do proprietário de dispor de sua unidade dentro dos limites estabelecidos pela legislação. Do outro, o dever do condomínio de observar e fazer cumprir as normativas legais e regulamentares aplicáveis, principalmente aquelas que visam o bem coletivo. A tensão entre esses princípios é comum em disputas condominiais.
A questão central do caso girava em torno de dois pontos:
1- A obrigatoriedade de cumprir o Decreto Municipal nº 64.244/2025, que se sobrepõe às disposições internas do condomínio.
2- A proteção da coletividade, garantindo que nenhum condômino infrinja normas que possam prejudicar o equilíbrio do empreendimento.
No caso das unidades HMP/HIS, o decreto não deixa margens para interpretações e estabelece que qualquer uso conflitante com a finalidade habitacional implica em infração direta à lei. A violação não impacta apenas o proprietário individualmente, mas pode trazer consequências também para o condomínio como um todo, sobretudo na conformidade legal junto ao município.
O Posicionamento do Condomínio
O condomínio, ciente de seu papel fiscalizador, adotou medidas administrativas cabíveis, com base em advertências e multas previstas tanto na convenção quanto no regulamento interno. Além disso, defendeu-se de alegações de irregularidade no seu posicionamento, apresentando os argumentos técnicos e legais que fundamentavam a proibição de locação por curta temporada.
Apesar de receber diversas notificações e contrapontos por parte do proprietário, o condomínio manteve sua posição firme, considerando que novas discussões sobre o tema seriam improdutivas, dado que as regras estão claras e respaldadas pelo Decreto Municipal nº 64.244/2025.
Reflexões Sobre o Caso
Esse caso reflete uma realidade cada vez mais frequente nos condomínios: a dificuldade de conciliar direitos individuais com o cumprimento de normas coletivas, sobretudo quando há imposições legais de caráter público.
Proprietários muitas vezes sentem-se lesados pela limitação de uso de suas unidades, sem perceber que as medidas visam proteger o patrimônio, a segurança e as condições de convivência de todos. Já os condomínios, por sua vez, enfrentam a resistência de condôminos que interpretam como arbitrárias as ações tomadas em cumprimento às suas obrigações legais.
Conclusão
Este caso não apenas reitera a importância de orientações claras e embasadas para evitar conflitos desnecessários, mas também destaca o valor de um diálogo transparente entre administração, condôminos e advogados. Enquanto cada parte busca defender seus direitos, é fundamental, sempre que possível, construir consensos e buscar soluções que respeitem as normas legais e os interesses coletivos.
No fim, a regra é simples: o cumprimento das normas deve prevalecer, especialmente quando estas têm respaldo em legislações específicas, como o Decreto Municipal nº 64.244/2025. Ao mesmo tempo, é essencial que condomínios demonstrem, com base técnica e jurídica, a necessidade das restrições, assegurando que a aplicação dessas normas seja feita de forma justa e transparente.
Se uma unidade insiste em descumprir as regras, é dever do condomínio — por mais desgastante que possa parecer — tomar as medidas cabíveis para resguardar o interesse coletivo e cumprir as determinações legais. Afinal, a harmonia na convivência condominial só é possível quando direitos e deveres são respeitados por todos.

O Limite Entre Direitos Individuais e Regras Condominiais: Um Caso de Unidade HMP/HIS e Locação de Curta Temporada
Recebi recentemente em meu escritório um caso que exemplifica os desafios da convivência em condomínios e a importância do equilíbrio