Projeto de Lei nº 4.739/2024 pretende regulamentar de forma compulsória a atuação de síndicos profissionais não condôminos
Márcio Spimpolo
O Projeto de Lei nº 4.739/2024, que pretende regulamentar de forma compulsória a atuação de síndicos profissionais não condôminos, representa uma intervenção estatal desnecessária, desproporcional e potencialmente danosa à governança condominial no Brasil. Mesmo em sua versão substitutiva, o PL incorre em vícios técnicos, constitucionais e econômicos que justificam sua rejeição integral.
O Código Civil já disciplina de forma completa e eficaz a atuação dos síndicos, sejam condôminos ou não. Os artigos 1.347 a 1.355 estabelecem mecanismos democráticos de eleição, atribuições claras, prestação de contas e controle assemblear. Não há lacuna normativa que justifique nova legislação.
O PL, ao exigir registro compulsório no CRA (Conselho Regional de Administração), cria uma burocracia ornamental sem demonstrar correlação entre tal exigência e melhoria na gestão ou redução de litígios. A proposta afronta pilares constitucionais como:
- Liberdade profissional (art. 5º, XIII): A sindicatura é função privada, sem risco social intrínseco que justifique regulação compulsória.
- Isonomia (art. 5º, caput): Cria distinção arbitrária entre síndico condômino e não condômino, embora ambos exerçam idênticas funções legais.
- Autonomia privada e autogestão condominial: Substitui a deliberação soberana da assembleia por filtros burocráticos externos.
- Livre iniciativa (art. 170): Impõe barreiras de entrada sem comprovação de falha de mercado, distorcendo a concorrência.
Ao exigir registro em conselho e “registro especial” para empresas, o PL favorece determinados perfis profissionais em detrimento de gestores experientes, mas não formalizados. Tal reserva de mercado pode gerar concentração, reduzir inovação e abrir espaço à captura regulatória por interesses corporativos.
A proposta eleva os custos operacionais dos condomínios, com taxas, cursos obrigatórios e compliance documental, impactando diretamente o valor das cotas condominiais. Além disso, a insegurança jurídica decorrente da possível nulidade de assembleias por vício formal de habilitação do síndico pode aumentar o passivo litigioso e os custos com seguros e advocacia.
A profissionalização da gestão condominial já ocorre por meio de mecanismos voluntários: certificações privadas, seguros de responsabilidade civil, auditorias independentes e plataformas de transparência. Imposições burocráticas engessam soluções adaptativas e desestimulam a evolução orgânica do setor.
Em vez de intervenção coercitiva, propõe-se: Código de Boas Práticas de Gestão Condominial; Cadastro voluntário de síndicos profissionais; Recomendação (não obrigação) de seguro RC; Portal eletrônico de contas padronizado; Certificação privada escalonada; Guia de duediligence para assembleias.
O PL 4.739/2024 não atende aos critérios de necessidade, adequação e proporcionalidade exigidos pela boa técnica legislativa e pela jurisprudência constitucional. Ao invés de proteger o interesse público, fragiliza a autonomia condominial, onera a moradia e favorece interesses corporativos. Recomenda-se sua rejeição integral e, subsidiariamente, a supressão das exigências de registro compulsório e a adoção de mecanismos voluntários de autorregulação.
O condomínio é, por essência, um espaço de governança privada compartilhada. Intervir sem evidência de falha estrutural é legislar contra a liberdade.