Por André Abal
Na semana passada, completei um marco significativo da minha trajetória profissional: conduzi a milésima assembleia de condomínio da minha carreira. São quase 25 anos dedicados ao mercado condominial, enfrentando todos os tipos de pautas, moradores, síndicos, conflitos e consensos. Ao longo desse percurso, aprendi lições valiosas — algumas óbvias, outras surpreendentes — que compartilho aqui não como verdades absolutas, mas como reflexões de quem vive, dia após dia, os bastidores da gestão condominial.
- O condomínio é um retrato do mundo em miniatura
Em uma assembleia, tudo se encontra: o conciliador, o contestador, o que nunca participa, o que participa demais, o advogado, o engenheiro, o cético, o entusiasta, o vizinho barulhento e até o “detetive” da gestão. Lidar com esse ecossistema humano exige empatia, firmeza, jogo de cintura e, sobretudo, escuta ativa. - A ata é o escudo da legalidade
Pouca gente lê a ata com atenção, mas ela é o documento que sustenta toda a legitimidade dos atos praticados. Aprendi que uma ata bem redigida não apenas evita conflitos futuros — ela também protege a gestão, esclarece mal-entendidos e, quando necessário, é a melhor defesa num processo judicial. Além disso ela é a “vitrine” da gestão. - O silêncio fala alto
A ausência dos condôminos em muitas assembleias não é só desinteresse — às vezes é cansaço, descrença ou receio de se envolver. Por outro lado, a ausência também pode significar contentamento, pois ninguém reclama daquilo que está satisfeito. Aprendi a interpretar as ausências, ler os não ditos, a entender que o silêncio também comunica, e que parte da nossa função é resgatar a confiança e o senso de pertencimento dos moradores. - A pauta certa move montanhas
As assembleias mais produtivas que conduzi foram aquelas com pautas objetivas, claras e que respeitavam o tempo e o interesse dos presentes. Quando o morador sente que sua presença faz diferença, ele se envolve mais. Priorizar o que realmente importa transforma a assembleia em um espaço de construção coletiva. - A gestão transparente é o melhor antídoto contra conflitos
Grande parte dos conflitos nasce na dúvida, na desinformação ou na má comunicação. Quando o síndico presta contas de forma clara, quando as decisões são fundamentadas e os canais de diálogo estão abertos, o ambiente melhora e os ruídos diminuem drasticamente. - Nem toda unanimidade é sábia, e nem toda divergência é negativa
Já vi decisões unânimes levarem a arrependimentos coletivos, assim como já presenciei debates acalorados resultarem em soluções brilhantes. O dissenso, quando respeitoso, é sinal de saúde democrática. Aprendi a não temer o conflito, mas a moderá-lo. - O segredo está na preparação
Uma boa assembleia começa bem antes do dia e hora marcados. Envolve convocação clara, documentos acessíveis, análise jurídica quando necessário, e, principalmente, o preparo emocional e técnico de quem irá conduzi-la. Um presidente experiente e preparado faz toda a diferença. - O que vale é o voto!
Embora a voz nas reuniões é um direito garantido a todos, o que conta mesmo é o voto. Não raro uma pessoa defende uma tese por muitos e muitos minutos e sua tese ou vontade resta vencida. O interesse individual deve ser comedido em prol do interesse comum que sempre prevalecerá. O Condomínio é uma democracia que funciona, desde que os condôminos frequentem os ambientes de decisões.
Chegar à milésima assembleia foi uma conquista pessoal, mas, acima de tudo, é um lembrete de que cada encontro entre condôminos é uma oportunidade de aprendizado, escuta, aprimoramento da convivência e exercício da cidadania. Enquanto houver moradores dispostos a dialogar, haverá sentido em reunir, debater e construir juntos as decisões desse pequeno universo que é cada condomínio.
Que venham as próximas mil.
* André Peixoto Abal é advogado especializado em Direito Condominial, sócio da Fênix Administradora de Condomínios em Balneário Camboriú/SC, com 23 anos de experiência. Professor em pós-graduação e certificado como Síndico 5 estrelas.
Uma resposta
Dr. André sempre perfeito em suas colocações. É um prazer ouvi-lo e ler suas ponderações.